terça-feira, 2 de agosto de 2011

COMO DESLUMBRAR UM CATADOR DE LIXO

Abrindo a revista Bravo, uma frase chama a minha atenção: "É como se a realidade não tivesse vida própria, mas dependesse dos olhos que a veem". E a noção de estética não depende da cultura e da sensibilidade do observador? Difícil, portanto, fazer uma análise objetiva da obra do Vik Muniz, já que objetividade não existe. O fato de não gostar daquilo que, para mim, não passa de espertas sacadas publicitárias pode estar circunscrito às minhas naturais limitações culturais. Agora, quando ele utiliza o escalão social mais humilde para se promover, sinto como uma alergia coçar minha nuca. O Google, sempre ele, revela a formação do rapaz: "...Frequentou aulas de publicidade e propaganda da Fundação Álvaro Penteado...". Só. Pelos vistos, soube fazer muito bom uso deste pouco ensino. Não tem 30 anos quando chega a NY.

Rica produção este Lixo extraordinário, com diretora inglesa, belos carros com motorista, grandioso galpão e parafernália audiovisual última geração. Durante uma hora mostrará como ele, branco de olhos claros, que já foi classe média baixa, é bom com os catadores cariocas. Destes, a produção escolheu os mais fotogênicos, aqueles que não irão agredir vernissage nenhum. Todos, homens e mulheres, são lindos e choram no momento oportuno. Me deu um nó na barriga ao ouvir o artista declarar ao belo catador negro: "Eu sou o artista brasileiro que mais vende no exterior". No cavernoso mercado internacional de arte contemporânea, Vik soube, é verdade, remar nas águas certas. Hoje, pula ostensivamente do português para o inglês e o leiloeiro suiço Simon de Pury, alma da Phillips, é uma star entre NY e Londres. Mesmo assim, conseguir R$100 mil para a foto do Marat com lixo está longe dos US$ 250 mil que pode alcançar uma obra de Beatriz Milhazes.

Mas o ditatorial triunvirato Feiras de arte/Museus/Leilões faz e desfaz reputações e cotações com uma facilidade que está mais perto da Bolsa de Valores de Wall Street do que da essência da Arte.

É provavel que muita obra retorne ao Jardim Gramacho.

Dimitri Ganzelevitch

Produtor cultural

Jornal a Tarde

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