terça-feira, 31 de agosto de 2010

Antes tarde do que nunca

A tomada das areias das praias de Salvador por barracas, cada vez maiores, teve a complacência das autoridades que, ao longo dos anos, permitiram a invasão do espaço público, obviamente ilegal. Fingiram que não viram. Em 2007, a Justiça Federal determinou que a Prefeitura de Salvador retirasse as barracas. O município recorreu. Os barraqueiros também agiram juridicamente para impedir o cumprimento da decisão.
Durante quase dois anos, quase nada aconteceu. As autoridades municipais e os barraqueiros pareciam apostar no impasse. Os orgãos federais e o Ministério Público, autores da ação, aguardavam a Justiça. O governo do estado não se manifestou. Mais de dois anos depois, o inevitável aconteceu. A ação foi retomada, o juiz Carlos D'Avila voltou a mandar derrubar as barracas. Só então, a prefeitura se mexeu para buscar uma alternativa: fez um projeto, tentou negociar. Os barraqueiros, provavelmente mal orientados, apostaram no impasse. Perderam. Os baianos acompanharam durante a semana o sofrimento dos comerciantes e empregados que viram suas barracas irem ao chão sem que qualquer alternativa tivesse sido construida. Agora, todos aparecem querendo ajudar. A Prefeitura, que demorou a buscar uma solução; o governo estadual, que sempre manteve-se distante do problema; os orgãos da União, que moveram a ação para retirar as barracas, até mesmo o Presidente da República: todos buscam uma solução que poderia ter sido encontrada antes deste desenlace dramático.
Tomara que essa boa vontade não seja fruto da temporada eleitoral. Os donos das barracas e seus empregados - mesmo ocupando ilegalmente aquele espaço - não são marginais. O Poder Público permitiu a instalação das barracas. O Poder Público deve agora criar uma alternativa que preserve a orla de Salvador, mas também garanta uma opção legal a quem realmente trabalhava na orla.
Antes tarde do que nunca.
Editorial Correio - 29 de agosto de 2010.


A orla de Salvador era realmente uma das mais feias em termos de ocupação. Ocupação ilegal, diga-se de passagem. Um acinte à beleza natural com que foi premiada. Mas essa ocupação cada vez mais acentuada e agressiva deu-se à vista dos passantes. Os fiscais, os responsáveis pelo ordenamento e ocupação do solo, nada viram, estavam cegos durante mais ou menos 30 anos. Os negócios cresceram, alguns se transformaram em restaurantes de luxo. Outros continuaram pequenos, mas constantes. Famílias foram construídas e mantidas por esse ramo de negócio.
Há uns quatro anos começou a tramitar na Justiça o pedido para demolição das barracas. Ao longo desse período não se tratou do problema social, não se acenou com qualquer alternativa, não se pensou na cadeia produtiva, não se atinou para nenhuma consequência. Agora, por causa de dois ou tres meses, a decisão e o ato de derrubar as barracas ocorreu bem no auge das campanhas eleitorais. Não é à toa que agora, todos, todos os envolvidos no processo estão divulgando reuniões e reuniões em busca de soluções. Neste momento os investimentos já viraram escombros, a maioria já transportada para o lixo. Ficaram mais de 500 empresários sem nada, nem seu investimento; ficaram, a calcular 6 funcionários por unidade, 3.000 pessoas desempregadas; ficaram sem clientes os vendedores de mariscos, carangueijos, siris, peixes; viram murchar suas vendas as cervejarias e os depósitos de bairros que tinham naquele segmento sua melhor fonte de vendas; ficaram sem clientes as centenas de vendedores ambulantes que nos enchiam diariamente oferecendo suas traquitandas; sem contar as baianas de acarajé, os vendedores de côco e uma infinidade de pessoas que viviam deste segmento nas praias. Fico eu órfã aos sábados outrora sagrados para um encontro com os amigos que nem precisava marcar, com sol ou chuva, naquela que era a barraca mais descuidada da região mas que ficava cheia pela qualidade da comida. Inesquecível a salada de polvo, fantástica a moqueca de camarão, inigualável o mal assado de filé. Onde chorarei minhas mágoas guardadas durante a semana? Onde gargalharei das mentiras alheias, das piadas infames, dos comentários sobre tudo e todos? Onde andará Meirinha com o melhor acarajé de Salvador?
Considero-me de luto, até que se encontre uma solução para os "desabrigados" da praia.

4 comentários:

Lucia Alfaya disse...

Que bom que você está de volta. Compartilho da sua indignação pela situação dos barraqueiros de praia de Salvador. Também acho que poderia ter sido encontrada uma solução menos traumática para o problema.
Bjs
Lúcia

Bípede Falante disse...

Sempre assim, o poder público e os políticos massacrando ou ignorando as pessoas até a hora em que se aproximam as eleições.

Nilson disse...

Isso tudo tem sido, de fato, muito doido. Vc viu a história da cadela que morreu eletrocutada?

Moniz Fiappo disse...

Pois é Nilson, a pobre cadela morreu mas poderia também ser um humano. Agora a prefeitura diz que foi a Coelba, a Coelba diz que foi o barraqueiro que fez gato...
Enfim, ninguém assumirá a culpa, e ficará tudo no mesmo.